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terça-feira, 24 de maio de 2011

Cultura da repetência e a prática do professor !!!!

Tenho lido muitos artigos e visto muitos depoimentos sobre a escola pública, que, embora avaliem de forma equilibrada os problemas que elas apresentam, escamoteiam, no âmago de sua argumentação, preconceitos ao fazer o diagnóstico desses problemas. Eles têm sido mais deletérios ao processo de educação das classes menos favorecidas que qualquer prática excessiva de repetência.

O primeiro preconceito parte da idéia de que é o professor que não sabe lidar com os problemas dessa classe popular, muito menos com os dos negros e que sua prática só reproduz todo tipo de preconceito racial e social. Esse argumento coloca o professor no paredão das políticas públicas e o responsabiliza pelas mazelas do fracasso de pobres e negros. Segundo esse fundamento, a raiz do problema está no fato dos professores reproduzirem a prática social, maculando alunos negros e pobres, ao dar maior atenção aos “arianos” e abastados. Partem da idéia de que as disciplinas que são ministradas nas escolas têm sua origem e fundamentação européias e, por isso, os professores reproduzem e impõem um conhecimento e cultura inadequados às camadas populares, impossibilitando a elas assimilar esse tipo de conhecimento. No entanto, esse argumento contém o mesmo preconceito racista e elitista que se pretende combater, pois ele permanece aí, só que às avessas, já que parte da idéia de que o conhecimento de uma dada cultura é melhor ou pior que de outra, que é mais adequado ou não a uma dada população, como se a cultura não fosse dinâmica e os povos não pudessem se defender, se adaptar, se misturar, assimilar outras culturas e serem assimilados por outros, se transformarem.

O segundo preconceito mascara o significado de “materialidade”. A questão da ausência de “materialidade" nas escolas é tomada como falta de "material": equipamento, insumo (papel, Xerox, etc.). Materialidade é uma coisa e material é outra. Ambos são importantes, mas a “materialidade” se refere ao USO ADEQUADO não só do “material” como também de outros recursos pedagógicos. Dar material escolar, instalar um laboratório de informática na escola de nada adianta se não se investe na materialidade: no uso eficiente desses recursos por um longo prazo, de forma constante, sem interrupções, para fins pedagógicos, de educação e ensino. De nada adianta ter professores suficientes, quando eles estão sempre adoecendo, ou ter laboratórios de informática deficientes e que não se saiba como usá-los.

O terceiro e mais perverso preconceito é esse o que considera o mau desempenho do aluno pobre e ou negro como fruto único de sua condição social (como se o cérebro desses alunos e sua capacidade cognitiva fosse prejudicado pela sua condição social). O fato de se querer eliminar, pura e simplesmente, a repetência, está no fundamento desse preconceito, como se a REPETENCIA fosse a causa e não o sintoma do problema. Elimina, sim, os custos e o investimento em educação que sobra para a corrupção ou para aventuras “pedagógicas” momentâneas e sem sentido.

Vamos rever de uma vez por todas esses problemas:

Quem deve e sabe lidar com os problemas dos alunos, bem ou mal, são aqueles que sofrem com esses problemas todos os dias, no trato diário com eles. Não são esses teóricos, ora economistas, membros da comunidade, jornalistas, o chefe de uma torcida de futebol etc. – pedagogos de plantão – que pouco contato têm com os problemas e sua natureza e sabem bem menos sobre essa realidade que os professores. Ouvir o professor deveria ser a primeira medida, por mais distorcida que seja a visão dele, pois é ele que pode e precisa compreender os problemas, senti-los, avaliá-los e tomar, instantaneamente, as medidas mais imediatas e adequadas para sanar o que está acontecendo com o aluno. Não é perfeito, mas é bem mais recomendável que ter o mesmo parâmetro de conduta para todos os casos e situações, sem olhar as especificidades e demandas da escola, do aluno ou da comunidade a que ela serve.
Essa proposta pedagógica, que eliminou a REPETÊNCIA, retirou, também, os professores do processo pedagógico da escola. Ele não é mais aquele que promove e avalia o aprendizado do aluno e ninguém mais o faz. Os provões só atestam o fracasso quando nada mais pode ser feito pelo aluno É como se quisessem que as doenças deixassem de existir só porque os médicos que as poderiam diagnosticar e tratar não pudessem mais fazê-lo. Um modelo como esse, que retira do profissional a autoridade de diagnosticar e atuar, seja na medicina, na educação, onde for, jamais poderá dar conta dos problemas que se pretende enfrentar. Em informática, por exemplo, não se podem eliminar os “vírus”, a fraude, os problemas de segurança da Internet, simplesmente impedindo que os profissionais da competentes avaliem os sistemas conectados, obrigando-os aprovar a todos.
É isso que se está fazendo quando a gente promove o aluno que não está adequadamente formado. Os pais e o próprio aluno não ficam sabendo que ele está tendo uma péssima formação e que não estão se empenhando suficientemente (cobrando de si, da escola e do governo). Então, o que falta é re-incluir o professor no processo para incentivá-lo a diagnosticar e buscar soluções e não – A SOLUÇÃO: NÃO REPETÊNCIA – para os problemas como querem nos fazer acreditar que seja possível acontecer. É preciso investir pesado na "materialidade", através de um programa de formação, com profissionais especialistas para lidar, diariamente, de dentro da escola, com cada aspecto do problema educacional, como se faz nas classes mais abastadas: aula de reforço, extra turno, quando é identificado um problema de aprendizado numa disciplina específica, ou o encaminhamento imediato do aluno, ou dos pais, mesmo de um professor para um atendimento de um médico ou de um profissional especialista, quando um problema social, físico ou psicológico for identificado. Não é ficar, como se tem feito, varrendo os problemas para dentro de sala de aula, obrigando o professor a resolvê-los, fazendo de conta que o aluno tem desempenho ruim só porque é negro ou pobre e a cultura que ele traz para a escola nunca é levada em conta pelo professor. Esse argumento é mais uma forma de esconder o fato de que esse aluno fracassa mais que os alunos das classes mais abastadas porque não tem acesso aos mesmos recursos.
Ser alvo de tanta experimentação (como se os meninos fossem ratos em laboratório) e de tantas controvérsias estúpidas (como se os alunos pudessem esperar que os “teóriOcos” decidissem que tipo de escola devemos ter) é que banalizou e destruiu a Escola Pública! Os cargos de supervisão e de gerência educacional ficam quase sempre com aqueles que pertencem ao partido ou coalizão no poder, que dizem amém, sem questionar, à política partidária vigente e dificilmente os cargos ficam com o profissional que conhece e se debruça sobre o problema para tentar entendê-lo e resolve-lo.
Penso que temos de escolher entre três tipos de escola, dependendo do investimento que pretendemos fazer na escola pública: ou encarceramos todos na escola e excluímos grande parte dos alunos de ter um ensino adequado ou pelo menos razoável, ou deixamos que boa parte deles fracasse e fique de fora e damos um ensino razoável para aqueles que conseguirem se destacar e ou permanecer na escola, ou realmente investimos pesado nas escolas para que todos alunos possam usufruir de um ensino semelhante ou superior ao oferecido às classes que têm condição de pagar escolas particulares.

Woodson Fiorini de Carvalho

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